Coluna

Impeachment do ex-capitão

- O braço esquerdo reimplantado da estátua de Zumbi dos Palmares, na Praça Dr. Acrísio Alvarenga, em Alucard, amiga Marineth, ostenta o cartaz impeachment de Bolsonaro, já! Pede, portanto, que o ex-capitão seja destituído da presidência da República, função que ocupa há menos de cinco meses. A manifestação é alusiva aos apelos dos protestos contra os cortes de verbas na área da educação, além das trapalhadas que são protagonizadas por integrantes do governo e dos desatinos dos filhos do presidente, sendo que um deles, Flávio Bolsonaro, tá na mira da justiça, suspeito de negociatas ilícitas quando era deputado pelo Rio de Janeiro.

- Athaliba, o descarrilamento do trem é eminente, antes mesmo de cruzar a curva do ‘S’. A estátua de Zumbi dos Palmares, que estava maneta há anos, em decorrência de vandalismo e do descaso e incompetência das autoridades alucardeanas, simboliza coerentemente o sentimento dos protestos no país. Afinal, antes mesmo da posse, ainda na campanha eleitoral, o presidente já pregava a discriminação à minoria, ao racismo e ao movimento LGBTi.

- Sim, Marineth. A situação conjuntural é gravíssima. Na rede de WhastsApp, o presidente divulgou, na manhã de 17/5, texto de autoria desconhecida no qual diz que “o sistema vai me matar”, insinuando que está em curso um golpe de Estado. Na introdução ele escreveu que “um texto no mínimo interessante; para quem se preocupa em se antecipar aos fatos sua leitura é obrigatória. Em Juiz de Fora (06/set/2018) tive um sentimento e avisei meus seguranças: ‘Essa é a última vez que me exporei junto ao povo’, pois o sistema vai me matar. Com o texto abaixo cada um de vocês pode tirar suas próprias conclusões”.

- Diante desse caos, Athaliba, qual a luz que se divisa no final do túnel?

- Nenhuma solução à vista, Marineth. Nos bastidores dos três poderes a ordem do dia é o possível impeachment de Bolsonaro, em sintonia com editoriais de alguns jornais. Nas entrelinhas pode-se compreender que a elite dominante procura uma saída institucional para continuar no poder em defesa de seus interesses, sinalizando a operação Mourão.

- Pô, Athaliba, a questão está centrada na inversão que contraria a hierarquia militar entre o presidente e o vice-presidente, respectivamente, com as patentes de ex-capitão e ex-general?

- Não, Marineth. Claro que não é isso. Dizem que a gota d’água que submerge Bolsonaro à gigantesca cratera do Pico Cauã é a incompetência dele em governar. Ele taxou os manifestantes do protesto em defesa da educação de “idiotas úteis” e, em contrapartida, foi chamado de “idiota inútil”. Nos poucos meses de governo comprovou inabilidade política, se orientando pelas teses do guru ideológico Olavo de Carvalho, que mandou o então ministro da Educação, o colombiano Ricardo Vélez Rodriguez, naturalizado brasileiro, indicado por ele, a enfiar o “ministério no cu”. O guru fomenta a discórdia no governo, defenestrando os militares que integram a equipe do ex-capitão.

- Sabe, Athaliba, nas comemorações do Dia Internacional de Combate à LGBTfobia, 17/5, os integrantes desse segmento da sociedade lembrou de insultos de Bolsonaro, demonstrando o seu ódio contra gays, lésbicas, bissexuais, travestis e transexuais, entre outros gêneros. A data é referência à decisão da Organização Mundial da Saúde (OMS) que retirou a homossexualidade da Classificação Internacional de Doenças (CID) há 27 anos. Quando ainda deputado federal, ele disse que “ter filho gay é falta de porrada”. Cabe advertir que o Diário Oficial da União publicou 15/5 o decreto que aprovou o Plano Nacional de Turismo 2018-2022, no qual retira o incentivo ao turismo LGBTi.

- Quero te recordar, Marineth, ainda sobre o guru Olavo de Carvalho, que ele, através de advogado, impetrou queixa-crime contra o cantor e compositor Caetano Veloso pelos crimes de calúnia, difamação e injúria, chamando o baiano de “canalha”. A ação tá no Foro Central Criminal da Barra Funda, em São Paulo. O guru de Bolsonaro alega que Caetano o ofendera ao publicar artigo em periódico paulista, criticando uma postagem nas redes sociais antes do segundo turno das eleições de outubro. O artista escreveu que “Olavo de Carvalho sugere em texto que, caso Bolsonaro se eleja, imediatamente à sua posse seus opositores sejam não apenas derrotados, mas totalmente destruídos enquanto grupos, organizações e até indivíduos”.

Sabe o que acho Athaliba? Acho que o guru quer se manter na mídia, alimentando sua vaidade. O tiro dele vai sair pela culatra.

- Também creio que o feitiço vai virar contra o feiticeiro, Marineth. Antes que a hipótese de impeachment se torne realidade, com o trem descarrilando na curva do ‘S’, deixe te declamar o poema Ressuscitando do caos, dedicado aos estudantes e professores na luta pela educação.

 

Nuvens cinzentas se agitam sob os céus da cidade,

Cobrindo, lentamente, todos os fluxos de luz do dia.

Nas ruas, os cidadãos cabisbaixos, sem ansiedade,

Circulam em zigue-zague desapossados de alegria.

 

Onde andará a esperança que tanto nos contagia?

Estará entre escombros o princípio da fraternidade,

Inserido na Carta Magna que orienta, serve de guia,

Como ponto de equilíbrio da igualdade e liberdade?

 

Ecoando como sinal de resistência, o grito solitário,

Ressuscitado no caos, incentiva guerreiros a lutar,

E as mazelas serão abolidas no ato revolucionário.

 

Não haverá mais intolerância, ódio, a nos sufocar:

Raios estouram nas trevas no sentido anti-horário,

Implantando nova ordem através do poder popular.

 

*Lenin Novaes, jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o concurso nacional Poesias de jornalistas, homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som – MIS.

Lenin Novaes

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Crônicas do Athaliba

LENIN NOVAES jornalista e produtor cultural. É co-autor do livro Cantando para não enlouquecer, biografia da cantora Elza Soares, com José Louzeiro. Criou e promoveu o Concurso Nacional de Poesia para jornalistas, em homenagem ao poeta Carlos Drummond de Andrade. É um dos coordenadores do Festival de Choro do Rio, realizado pelo Museu da Imagem e do Som - MIS

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