Moraes retira sigilo e libera vídeos de depoimentos de testemunhas da trama golpista
Gravações revelam embates, contradições e detalham reuniões sobre decretos de Estado de Sítio; julgamento de Bolsonaro e aliados está previsto ainda para este ano

Brasília - O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou nesta terça-feira (3) o sigilo dos vídeos dos depoimentos prestados por 52 testemunhas no processo que apura uma suposta trama golpista articulada para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder após sua derrota nas eleições de 2022.
As audiências ocorreram entre 19 de maio e 2 de junho, com restrição à gravação por parte da imprensa, a fim de evitar acordo prévio de versões entre as testemunhas. Com o fim da fase de oitivas, as gravações foram liberadas e mostram um panorama detalhado dos bastidores da crise institucional.
Os vídeos registram momentos de tensão, contradições entre testemunhas e embates diretos com o ministro Moraes, além de declarações reveladoras sobre reuniões em que Bolsonaro teria discutido mecanismos de ruptura institucional, como decretar Estado de Sítio e acionar GLO (Garantia da Lei e da Ordem).
Principais pontos revelados nos vídeos
Confirmação de estudos sobre GLO e Estado de Sítio
Testemunhas de acusação relataram que Bolsonaro apresentou estudos jurídicos para embasar ações golpistas, incluindo decretos que dariam a ele poderes excepcionais sob alegações de instabilidade institucional.
Defesa nega intenção golpista
Testemunhas de defesa, por outro lado, negaram a existência de plano de golpe e afirmaram que o ex-presidente jamais mencionou impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Momentos de tensão nas audiências
General Freire Gomes advertido
No primeiro dia de oitivas, o general Marco Antônio Freire Gomes foi advertido por Moraes após tentar minimizar uma suposta fala do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, que teria colocado a Força à disposição de Bolsonaro:
“O senhor falseou a verdade na polícia ou está falseando aqui”, disse Moraes.
Freire respondeu: “Em 50 anos de Exército, jamais mentiria.”
Reunião golpista confirmada
O ex-comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro Baptista Júnior, confirmou uma reunião na qual Bolsonaro sugeriu decretar Estado de Sítio e GLO, e relatou que Freire Gomes teria dito que prenderia Bolsonaro caso ele levasse o plano adiante — versão negada por Freire.
Aldo Rebelo quase preso
O ex-ministro Aldo Rebelo, testemunha de defesa de Almir Garnier, foi ameaçado de prisão por Moraes ao tentar interpretar falas do almirante, contrariando a orientação do tribunal.
“Se o senhor não se comportar, será preso por desacato”, afirmou o ministro.
Moraes repreende defesa de Anderson Torres
Durante o depoimento de Freire Gomes, Moraes interrompeu o advogado de Anderson Torres, Eumar Novak, por insistência em uma mesma pergunta:
“Não estamos aqui para fazer circo no meu tribunal”, disse o ministro, visivelmente irritado.
Tarcísio nega rupturas
O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, testemunha de defesa de Bolsonaro, declarou que nunca houve menção a golpe nas conversas que teve com o ex-presidente.
“Jamais se tocou nesse assunto, jamais mencionou ruptura”, afirmou.
Próximos passos do processo
O STF já marcou os interrogatórios dos oito réus do núcleo central (Núcleo 1) para começarem na próxima segunda-feira (9). Os depoimentos acontecerão presencialmente na Primeira Turma e serão transmitidos ao vivo pela TV Justiça e pelo YouTube.
A expectativa é de que o julgamento ocorra ainda este ano, com possibilidade de penas que superam 30 anos de prisão.
Réus do núcleo 1:
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Jair Bolsonaro, ex-presidente
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Walter Braga Netto, general e ex-ministro
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Augusto Heleno, general e ex-ministro do GSI
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Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin
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Anderson Torres, ex-ministro da Justiça
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Almir Garnier, ex-comandante da Marinha
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Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa
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Mauro Cid, tenente-coronel e delator
Todos são acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos crimes de:
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Organização criminosa armada
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Tentativa de abolir violentamente o Estado Democrático de Direito
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Golpe de Estado
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Dano qualificado por violência
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Deterioração de patrimônio público tombado
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