Mortes causadas pelo calor podem dobrar na América Latina em 20 anos, aponta estudo
Pesquisa com dados de nove países revela que o envelhecimento populacional e o avanço do aquecimento global devem aumentar significativamente o número de óbitos relacionados ao calor
Brasília – O calor extremo já é responsável por cerca de uma em cada cem mortes na América Latina, e esse número pode mais do que dobrar até 2045, segundo um estudo publicado na revista Environment International. A projeção leva em conta o ritmo atual de envelhecimento populacional e cenários moderados de aquecimento global, com aumento de temperatura entre 1°C e 3°C nas próximas duas décadas.
A análise envolveu 326 cidades de nove países — Argentina, Brasil, Chile, Costa Rica, El Salvador, Guatemala, México, Panamá e Peru — e integra o projeto Mudanças Climáticas e Saúde Urbana na América Latina (Salurbal-Clima), que reúne pesquisadores latino-americanos e norte-americanos.
Atualmente, as mortes relacionadas ao calor representam 0,87% do total na região. No pior cenário, o índice pode subir para 2,06%, mais do que o dobro da taxa atual.
“As pessoas idosas e as mais pobres são as que mais sofrem. Quem vive em áreas periféricas, em moradias precárias e sem acesso a ar-condicionado ou a espaços verdes terá mais dificuldade para enfrentar ondas de calor cada vez mais intensas”, explica Nelson Gouveia, professor do Departamento de Medicina Preventiva da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP) e um dos autores do estudo.
“As mortes são apenas a ponta do iceberg. O calor extremo aumenta o risco de infartos, insuficiência cardíaca e outras complicações, especialmente em pessoas com doenças crônicas”, completa o pesquisador.
Cenário brasileiro
No Brasil, os dados usados no estudo foram obtidos a partir do Sistema de Informações sobre Mortalidade (SIM), do DataSUS, e do Censo Demográfico do IBGE. Os pesquisadores destacam que, além do calor, os eventos climáticos associados ao frio também devem causar mais mortes, especialmente entre pessoas com mais de 65 anos, grupo que tende a crescer significativamente até meados da década de 2040.

Como evitar o pior
Os cientistas apontam que parte dessas mortes pode ser evitada com políticas públicas de adaptação climática voltadas à proteção das populações mais vulneráveis. Entre as medidas sugeridas estão:
-
• Planos de ação para períodos de calor extremo;
-
• Expansão de áreas verdes e corredores de ventilação urbana para reduzir as ilhas de calor;
-
• Sistemas de alerta precoce com comunicação acessível à população;
-
• Protocolos de atendimento prioritário para idosos e pessoas com doenças crônicas, como já ocorre no Rio de Janeiro;
-
• Campanhas de educação comunitária sobre os riscos e formas de proteção.
O projeto Salurbal-Clima, que tem duração de cinco anos (2023 a 2028), busca reunir evidências sobre a relação entre mudanças climáticas e impactos na saúde pública em países latino-americanos.
O estudo completo pode ser acessado na revista Environment International.
Comentários