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ADEUS, ARLINDO CRUZ

arlindo cruz
Arlindo Cruz / Divulgação - 

Rio de Janeiro – Conheci Arlindinho - era assim que Arlindo Cruz era conhecido - no tempo em que eu morava ao lado da quadra do Cacique de Ramos – ou foi no “Pagode do Arlindinho”, na Padre Telêmaco, em Cascadura? Não lembro.

Arlindo - desde os tempos em que, na quadra do Cacique, ficava esperando o descanso de bambas como Almir Guineto, Neoci, Bira, Ubirani, Beto Sem Braço, Dedé, Luiz Carlos da Vila e outros para mostrar o seu trabalho - sempre foi um cara talentoso, alegre e bonachão.

Mudei-me de Ramos para a Penha e só fomos nos encontrar novamente num show do Grupo Fundo de Quintal, no Teatro João Caetano, na Praça Tiradentes. Ele havia deixado o grupo e começava uma carreira solo. Mas estava ali pra dar uma canja no show dos amigos do Fundo de Quintal. Depois do show, fomos beber com Arlindo Cruz, Sombrinha – que também tinha participado do show – e a rapaziada do Fundo de Quintal, num boteco, ali mesmo na Praça Tiradentes.

O ano era 1994. Um ano antes, Arlindo Cruz tinha gravado um disco - “Arlindinho” – pela Line Record, uma gravadora evangélica. Um puta disco (perdão, pastor). Tinha músicas do Sombrinha, Almir Guineto, Marquinhos PQD, Zeca Pagodinho, Candeia, Wilson Moreira, Dona Ivone Lara, Monarco, Délcio Luiz, Acyr Marques e, claro, do próprio Arlindo, entre outros.

Neste disco, outro grande mestre, o saudoso Aniceto - fundador do Império Serrano (Escola do coração do Arlindo Cruz) -, nos dá uma aula de como fazer um samba de roda (“Dora”), usando apenas uma rima. Coisa de gênio.

O disco tocou muito nas rádios, mas foi um fracasso comercial. Era um grande disco, na gravadora errada.

Com isso, o pastor, devendo ao Arlindo, pagou com os discos. “Porra, Ediel, minha casa tá lotada de discos, vende pra mim”, me pediu Arlindo. Indique um amigo que tinha umas lojas de discos no Saara, no centro do Rio, e ele negociou os discos.

Arlindo Cruz trocou de gravadora, e estourou no Brasil inteiro. Sempre que nos encontrávamos, pelos pagodes da cidade, lembrávamos do disco do pastor.

Hoje, Arlindo Cruz foi embora. Foi fazer seu show no céu.

Nascido em 14 de setembro de 1958, no bairro do Engenho Novo, no Rio de Janeiro, Arlindo Domingos da Cruz Filho era um dos cantores mais talentosos do samba carioca. Filho de Aracy Marques da Cruz e Arlindo Domingos da Cruz, além de escrever e cantar, Arlindo ficou famoso por tocar cavaquinho e banjo. Ganhou o primeiro cavaquinho aos 7 anos. Aos 12, começou a tocar músicas "de ouvido" e aprendeu violão ao lado do irmão Acyr Marques.

Ainda jovem, estudou teoria musical e violão clássico na escola Flor do Méier. Apartir daí, passou a atuar como músico profissional, acompanhando vários artistas, incluindo um ícone do estilo, Candeia, uma espécie de "padrinho musical". A primeira gravação em estúdio foi o LP, "Roda de Samba", depois relançado em CD.

Aos 15 anos, foi para Barbacena (MG). Por lá, estudou na escola preparatória de Cadetes do Ar. Na volta ao Rio, passou a frequentar a roda de samba do Cacique de Ramos. Nela, tocou com Jorge Aragão, Beth Carvalho e Almir Guineto, Zeca Pagodinho e Sombrinha. Na época, teve músicas gravadas por vários outros intérpretes entre elas, “Lição de Malandragem”, “Grande Erro” (Beth Carvalho) e “Novo Amor” (Alcione).

A virada na carreira, veio ao substituiu Jorge Aragão, que saía do Grupo Fundo de Quintal. Ficou 12 anos no grupo onde gravou sucessos como “Seja sambista também”, “Só Pra Contrariar”, “Castelo Cera”, “O Mapa da Mina” e “Primeira Dama”. Saiu do grupo em 1993. Arlindo Cruz tem quase 600 músicas gravadas, por ele e por vários outros artistas. O artista partiu, mais sua obra ficará para sempre entre seus fãs.

Adeus, amigo.

Ediel Ribeiro (RJ)

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Ediel Ribeiro é carioca. Jornalista, cartunista e escritor. Co-autor (junto com Sheila Ferreira) do romance "Sonhos são Azuis". É colunista dos jornais O Dia (RJ) e O Folha de Minas (MG). Autor da tira de humor ácido "Patty & Fatty" publicadas nos jornais "Expresso" (RJ) e "O Municipal" (RJ) e Editor dos jornais de humor "Cartoon" e "Hic!". O autor mora atualmente no Rio de Janeiro, entre um bar e outro.

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