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Moraes retira sigilo e libera vídeos de depoimentos de testemunhas da trama golpista

Gravações revelam embates, contradições e detalham reuniões sobre decretos de Estado de Sítio; julgamento de Bolsonaro e aliados está previsto ainda para este ano

Foto: Antonio Augusto / STF - 

Brasília - O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), retirou nesta terça-feira (3) o sigilo dos vídeos dos depoimentos prestados por 52 testemunhas no processo que apura uma suposta trama golpista articulada para manter o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) no poder após sua derrota nas eleições de 2022.

As audiências ocorreram entre 19 de maio e 2 de junho, com restrição à gravação por parte da imprensa, a fim de evitar acordo prévio de versões entre as testemunhas. Com o fim da fase de oitivas, as gravações foram liberadas e mostram um panorama detalhado dos bastidores da crise institucional.

Os vídeos registram momentos de tensão, contradições entre testemunhas e embates diretos com o ministro Moraes, além de declarações reveladoras sobre reuniões em que Bolsonaro teria discutido mecanismos de ruptura institucional, como decretar Estado de Sítio e acionar GLO (Garantia da Lei e da Ordem).

Principais pontos revelados nos vídeos

Confirmação de estudos sobre GLO e Estado de Sítio

Testemunhas de acusação relataram que Bolsonaro apresentou estudos jurídicos para embasar ações golpistas, incluindo decretos que dariam a ele poderes excepcionais sob alegações de instabilidade institucional.

Defesa nega intenção golpista

Testemunhas de defesa, por outro lado, negaram a existência de plano de golpe e afirmaram que o ex-presidente jamais mencionou impedir a posse do presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT).

Momentos de tensão nas audiências

General Freire Gomes advertido

No primeiro dia de oitivas, o general Marco Antônio Freire Gomes foi advertido por Moraes após tentar minimizar uma suposta fala do ex-comandante da Marinha, Almir Garnier, que teria colocado a Força à disposição de Bolsonaro:

“O senhor falseou a verdade na polícia ou está falseando aqui”, disse Moraes.

Freire respondeu: “Em 50 anos de Exército, jamais mentiria.”

Reunião golpista confirmada

O ex-comandante da Aeronáutica, Tenente-Brigadeiro Baptista Júnior, confirmou uma reunião na qual Bolsonaro sugeriu decretar Estado de Sítio e GLO, e relatou que Freire Gomes teria dito que prenderia Bolsonaro caso ele levasse o plano adiante — versão negada por Freire.

Aldo Rebelo quase preso

O ex-ministro Aldo Rebelo, testemunha de defesa de Almir Garnier, foi ameaçado de prisão por Moraes ao tentar interpretar falas do almirante, contrariando a orientação do tribunal.

“Se o senhor não se comportar, será preso por desacato”, afirmou o ministro.

Moraes repreende defesa de Anderson Torres

Durante o depoimento de Freire Gomes, Moraes interrompeu o advogado de Anderson Torres, Eumar Novak, por insistência em uma mesma pergunta:

“Não estamos aqui para fazer circo no meu tribunal”, disse o ministro, visivelmente irritado.

Tarcísio nega rupturas

O governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, testemunha de defesa de Bolsonaro, declarou que nunca houve menção a golpe nas conversas que teve com o ex-presidente.

“Jamais se tocou nesse assunto, jamais mencionou ruptura”, afirmou.

Próximos passos do processo

O STF já marcou os interrogatórios dos oito réus do núcleo central (Núcleo 1) para começarem na próxima segunda-feira (9). Os depoimentos acontecerão presencialmente na Primeira Turma e serão transmitidos ao vivo pela TV Justiça e pelo YouTube.

A expectativa é de que o julgamento ocorra ainda este ano, com possibilidade de penas que superam 30 anos de prisão.

Réus do núcleo 1:

  • Jair Bolsonaro, ex-presidente

  • Walter Braga Netto, general e ex-ministro

  • Augusto Heleno, general e ex-ministro do GSI

  • Alexandre Ramagem, deputado federal e ex-diretor da Abin

  • Anderson Torres, ex-ministro da Justiça

  • Almir Garnier, ex-comandante da Marinha

  • Paulo Sérgio Nogueira, general e ex-ministro da Defesa

  • Mauro Cid, tenente-coronel e delator

Todos são acusados pela Procuradoria-Geral da República (PGR) pelos crimes de:

  • Organização criminosa armada

  • Tentativa de abolir violentamente o Estado Democrático de Direito

  • Golpe de Estado

  • Dano qualificado por violência

  • Deterioração de patrimônio público tombado

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